quinta-feira, 2 de julho de 2015

Sobre os tão temíveis Chifres




Na imagem acima é Moisés. Sillería de coro de la catedral de San Salvador de Oviedo. Obra realizada entre 1491 y 1497. 

Na tradição judaico-cristã, o chifre simboliza também a força e tem o sentido de raio de luz, de relâmpago. Como pode ser visto na passagem de Habacuc (3, 4-5), que fala da mão de Deus de onde saem raios (chifres). “Seu brilho é como a luz, raios saem de sua mão, lá está o segredo de sua força”. Já nos Salmos, o chifre simboliza o poder de Deus, que é a mais poderosa defesa daqueles que o invocam: “Nele me abrigo, meu rochedo, meu escudo e meu chifre de salvação” (18,4) [versão da Bíblia do Rei James, a tradução mais literal que se tem dos textos originais].

Quando Moisés desceu do Sinai, seu rosto resplandecia (Êxodo, 34, 29), i.e., lançavam raios. A palavra “raios” é traduzida no sentido próprio como chifres na Vulgata. Por isso, os artistas medievais apresentavam Moisés com chifres no alto da cabeça (como o Moisés de Michelangelo 1513-1515). Esses dois cornos têm o aspecto de crescente lunar. Os 4 cornos do altar dos holocaustos, postos no templo, designam as 4 direções do espaço, a extensão ilimitada do poder do Divino. “Ali farei brotar um chifre em Davi” (132,17).

Jung percebe no chifre o princípio ativo, masculino e a força da penetração e, um princípio passivo e feminino, por sua abertura em forma de lira e de receptáculo, reunindo esses dois princípios no ser humano, na formação da personalidade, assumindo-se integralmente com as duas polaridades potenciais, atinge a maturidade, o equilíbrio, a harmonia interior, isso comprova a força ambivalente solar-lunar contida potencialmente em cada um.

A própria expressão hebraica “Abreg ad Habra”, foi vulgarizada pela forma popular de encantamento “abracadabra”, mas na origem hebraica significa “lance teu raio até a morte”, ou melhor dizendo: “lance teus chifres a vida toda até depois da morte”, um ciclo sem fim significando “meu Deus vence pela eternidade”.

Sett Ben Qayin


sexta-feira, 20 de março de 2015

Qual a sua Graça?


Essa pergunta foi empregada para perguntar o nome de alguém. Mas o que apontamos aqui é a Gratia latina. Agradecimento gratuito!
Não se paga pelo que a natureza nos dá. É um dom gratuito dado pelo divino para conceder sua salvação e suprir sua existência.

Se você relembrar as Graças, as deusas do banquete, concórdia, encanto e gratidão, prosperidade familiar e sorte, irá se dar conta de qual beleza sua vida é feita.
Esse dom está na sua beleza interna. Convido você leitor a dar um mergulho em si, nas suas profundezas, hoje mesmo.
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domingo, 8 de setembro de 2013

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Transformar a Batalha em Dança

This is a portuguese translation of the original article published in The Starry Cave, entitled To Turn a Battle into Dance. If you are an english reader, please click here to visit the author's blog and read the original text.



Transformar a Batalha em Dança

Provocação é algo que todos nós experimentamos, seja por acaso ou deliberadamente. Uma palavra impensada dita num momento inoportuno ou a ação precipitada que damos ao mundo em um dia ruim pode convidar o conflito. Às vezes as pessoas provocam algum tipo de reação porque se sentem mal com elas mesmas ou porque sofrem de inveja. Em outros momentos, é o medir de força, ou buscam vencer uma discussão para que se sintam melhor com elas mesma ou com a filosofia que tomam como bússola em suas vidas. Não há limite para o que pode nos provocar e, por isso, em vez de acolher a energia negativa de uma provocação, é melhor dar um passo para trás e ver o que podemos fazer com a provocação. Para Oscar Wilde a resposta para uma provocação era pagá-la com bondade, pois nada provocaria mais do que isso.


Ifá põe iwa rere no centro da fortuna — um caráter alegre, calmo e próspero. Se é isso o que buscamos manter, qualquer provocação será somente uma dança, e não uma batalha. No odu Ogùndábàrà encontramos uma história sobre Obara, um jovem poder vigoroso associado com um Sango jovem e imaturo (o espírito do trovão e fogo) que desafiou OgunOgun é o patriarca dos caçadores, um poder primordial que deu origem as estradas, ferreiros, e foi fundamental na criação da humanidade. Podemos dizer que Ogun é a própria forja, enquanto Obara representa apenas o fogo — um produto mais jovem da forja. Nesta história Obara aparentemente provoca Ogun ao ponto de que ele está determinado a matar Obara, mas ao invés disso ele faz ebo/sacrifício. Neste caso, seu sacrifício foi uma mudança de atitude na qual ele percebe que poderia entreter a provocação de Obara, mas como uma dança e não uma batalha. O verso diz o que se segue:
Rìtìrìtì ni ojú ijó
Rìtìrìtì ni ojú ìja
A dífá fún Ògún
Nlo ba Òbàrà já ìjà kan
Wòn nì Ògún á dáa
Sùgbón ki Ògún wá sebo
Kí Òbàrà má baà kú síi lórùn
Ó gbó ó Ru
Wón ní adie kìí ba adìe já ki ó kú
Agbòn ìràwé kìí wúwo
Kí ó d’éru pa’ni

Na tradução de Karenga: 

Tumultuoso é o local da dança
Tumultuoso é o local da batalha
Este foi o ensinamento de Ifá para Ogun
Quando este estava indo se engajar na batalha com Obara
Eles disseram que Ogun atuaria bem
Mas que Ogun deveria fazer sacrifício
Para que Obara não fosse morto na
Peleja
Ele [Ogun] ouviu e sacrificou
Eles disseram que um pássaro não deveria lutar
Com outro pássaro até a morte
E uma cesta de folhas secas não é forte o suficiente,
Que seu conteúdo deva matar alguém

Esta é uma boa atitude para se manter quando confrontado com provocações em geral, pois se vemos a batalha como uma dança onde ‘golpeamos’ nosso provocador com ‘folhas secas’, podemos ensinar uma lição — e ganhar uma lição, embora também devamos ter em mente que a dança - dentre o povo iorubano - é vista como [composta de] movimentos cósmicos. A dança pode interpretar os movimentos das estrelas, ela pode levar a vida desorganizada de volta à harmonia e pode ser utilizada como divinação ou como um veículo para o diagnóstico de doenças. Em última análise, a dança tem o poder de curar e a dança de cura é realizada por pessoas que possuem iwa rere — um caráter jovial e calmo. Foi com esta atitude que Ogun tomou o desafio de Obara, sabendo que ele era mais velho, mais sábio e mais forte — ainda assim, estamos todos juntos na dança da vida, neste mercado que é a nossa jornada. Ogun entendeu isso e abraçou o desafio com interesse e alegria e não como uma batalha. Certamente esta é uma atitude mais digna quando confrontados com provocação — na verdade, esta atitude tem em si um fio socrático e nesta existem mais metas para a ampliação de horizontes de compreensão do que a provação de um ponto ou a definição de quem está certo e quem está errado. A batalha que se transforma em uma dança de palavras e opiniões estimulando e recompensando mutuamente — e nisso a dança cósmica de alegria e harmonia é replicada. Ase O!

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Rosh ha Sitan e as transições de Lilith

This post was originally published in The Starry Cave. 




Lilith, originalmente um espírito dos ventos hostis na Penísula Arábica, se tornou uma devoradora de crianças, um súcubo e finalmente uma Rainha dos vampiros. A Primeira mulher de Adão, segundo o ben Sira e uma rainha demoníaca e  hostil, de acordo com o Zohar.

Lilith era um espírito estrangeiro e intruso; encantamentos eram feitos para afastá-la - e anjos eram enviados para pôr fim na procriação de seus lilins. Os mensageiros angelicais tiveram que fazer uma trégua e um acordo – ela estava aqui para ficar. Ela surge a partir de um espírito fadado a morrer, como um dinossauro – no entanto seu legado e proeminência ainda são espalhados por todo o mundo com o desenvolvimento da história. Quanto mais derramamento de sangue  e devastação encontramos, mais encontramos Lilith.

Lilith ascende à proeminência no mundo a partir das sombras das tempestades e dos maus agouros. Ao longo do tempo ela foi associada à  Lua, com Vênus, à mãe dos Djinn e a mãe dos Sidhe (‘fadas’). Ela foi tratada como um súcubo – ou a mãe deles, como um Espectro e uma Feiticeira. Da Suméria e Caldéia ela esticou suas asas sobre Edom, Síria, Arábia e Europa. Blavatsky a viu como uma sombra éterea primordial da sexualidade – e é a partir de sua teosofia que encontramos as idéias modernas que a enxergam como um ícone da mulher reprimida que busca o domínio.

No livro de necromancia intitulado ‘Forbidden Rites’ (Ritos Proibidos, Penn State Uni Press., 1997) Richard Kieckhefer fornece instruções para a criação de um espelho de Lylet ou Lilith. Este espelho deve ser confeccionado  nos dias de Saturno, nas horas de Marte (i.e. o maléfico com maléfico). O gênio daemônico, contudo, é chamado Floron. Floron deve er uma referência a um espírito do verde, sendo floral pelo o nome e, portanto, uma referência ao Jardim do Éden pode ser detectada.

No Lemegeton temos dois candidatos que podem estar lingüisticamente relacionados e, assim, pode ser que Floron seja na verdade ou Flauros (Havres) e/ou Focalor, ambos duques sob os raios de Vênus. Flauros é um duque formidável que surge na forma de um homem-leopardo, e nos diz muito sobre a hoste caída e as condições do mundo antes da queda. Ele é um duque impetuoso e ígneo e pode ser utilizado em trabalhos de vingança. Ele recebe o valor cabalístico de 212, ‘esplendor’. Focalor aparece como um grifo, uma criatura com o corpo de leão e asas de águia. Ele é um espírito do vento que é ligado aos oceanos e mares. Seu valor cabalístico é 342, que significa ‘caminho’. Juntos eles resultam em 554 que é Zorea Zara, ‘carregar a semente’ – conseqüentemente, algo fértil acontece aqui, onde o caminho do esplendor se abre para a semente. Diz-se também que foi prometido a Focalor entrar novamente no céu após mil anos de servidão, – mas no final a entrada foi negada.

Então, o próprio espelho é um produto dos duques do Lemegeton, um espelho de Vênus. Porém, este espelho de Vênus deve ser produzido quando os dois maléficos, Marte e Saturno estão fortes – ou para trabalhos benevolentes quando Júpiter e Saturno são encontrados em bons aspectos entre si. Além disso, Flauros é um demônio de Capricórnio enquanto Focalor é um demônio de Touro – e Touro é o signo que detém a estrela Algol na constelação de Perseu. Assim como Medusa procurou refúgio em uma caverna, Lilith procurou refúgio numa caverna no mar vermelho.

Encontramos sua mais recente interpretação na série ‘True Blood’ da HBO. Aqui Lilith surge de poças de sangue causados pela intoxicação de seus lilins que entram em uma sede de sangue frenética – e ela mesma traz dispersão e devastação em uma estranha sedução em seus filhos. Talvez esta visão seja a mais precisa na percepção de sua natureza. Trata-se de dominação, de êxtase, de frustração. Lilith é sexual, mas ela está muito mais relacionada com a frustração da liberação tardia da sexualidade, atípica da tradição vama marg da prática tântrica kaula do que um com um florescente jardim de delícias sexuais. Assim como a lua negra astrológica – a ela associada – é um ponto matemático no espaço, ela também é um estado mental semelhante ao que é conhecido no BSDM como ‘subestado’.

Ela não é um poder restrito à ordem estabelecida pelos homens e, portanto, ela sempre escapa de qualquer rótulo e qualquer tentativa de colocá-la em uma caixa racional nítida de clareza e identidade. No momento em que isso acontece, ela se liberta e declara que ela é diferente disso.

Como o mundo neo-pagão está crescendo, a veneração de Lilith como um daimon da sexualidade e poderes femininos também tem visto um crescimento. Apesar de nunca ter sido um daimon da fertilidade ou da maternidade, ela é cada vez mais tratada como tal. Ela é vista como uma salvadora de mulheres reprimidas, e talvez nisto ela tenha uma função benevolente. Mas isto não é ela; ela é muito mais…

Lilith passou por uma transição nos dias modernos que é muito semelhante ao que encontramos na astrologia, considerando a natureza da oitava casa e o signo de Escorpião. A astrologia moderna vê a casa 8 regida por Escorpião e vê Escorpião como o impulso sexual primordial. A astrologia clássica vê o signo de Escorpião regido por Marte,  um signo escuro e úmido que é intuitivo e sedento pela morte. Sua sexualidade está em conformidade com instintos primordiais de sobrevivência e procriação, como ocorre na maioria dos anfíbios. A oitava casa é em si um local onde morte – e conseqüentemente heranças são lidas e previstas. Na oitava casa Saturno encontra seu júbilo e é aqui que todo maléfico se une na luxúria anfíbia dos crocodilos, víboras e escorpiões…

Então, certamente, Lilith é um daimon sexual, mas seu luxúria erótica é o da noite e das sombras. Na verdade, ela é a erva venenosa  e a cabeça da Medusa – ela está além dos planetas, ela é Algol – e aqui na terra, tais questões estelares se manifestam como  terror. Ela não  gentil, ela era a esposa de Samael, o veneno de Deus, e era a árvore proibida, o próprio contrapeso. Ela era a mãe dos amaldiçoados, aqueles que foram chamados de bruxos e feiticeiros por aqueles que não conseguiram entendê-La, nem aos seus filhos.


Ela é verdadeira  e profundamente ligada com a estrela Algol ou al-ghûl – nomeada assim dada a classe de djinns de mesmo nome. Tal estrela é encontrada no heléboro e nos diamantes. É distintivamente saturnina, mas exaltada quando Marte está ascendendo. O impulso de Vênus está relacionado a graça feminina, ao velar dos diamantes no heléboro para deflagrar vingança ou caos...